terça-feira, 15 de maio de 2012

O regresso ao dracma??

No momento em que aumentam as especulações sobre a saída da Grécia da zona euro, é preciso perceber que o país não pode sobreviver sem a moeda única e que a Europa não pode permitir a sua saída. Por isso, ambos têm que colocar as cartas na mesa. Em diversos países e regiões, o veredicto dos eleitores está dado. A solução baseada apenas na austeridade é um fracasso. Agora, há que o interiorizar e iniciar negociações, que se preveem difíceis, que poderão levar a compromissos penosos. Mas, é urgente que a Grécia esteja pronta para tudo. E será necessário distinguir a realidade das ameaças e das chantagens que se trocam neste momento. Em primeiro lugar, a Grécia não está preparada para sobreviver por si mesma. Sem as ajudas da Europa e do Fundo Monetário Internacional (FMI), em breve o dinheiro faltará para pagar os salários dos funcionários públicos e para comprar ao estrangeiro aquilo de que necessita para sobreviver, a começar pelos produtos alimentares e pelo petróleo. Em segundo lugar, após as reestruturações impostas aos credores privados, atualmente quase metade da dívida grega está nas mãos da Europa ou do Fundo Monetário Internacional. Portanto, se a Grécia não pagar, serão sobretudo os contribuintes da zona euro, ou seja, todos nós (mil euros por cabeça, numa estimativa sumária), quem irá desembolsar. Em terceiro lugar, o regresso ao dracma só seria vantajoso na imaginação de economistas pouco informados, quase todos americanos. O governo de Georges Papandreou encomendadou um estudo que concluía que mesmo os dois setores que proporcionam à Grécia os seus rendimentos principais, o turismo e a marinha mercante, não beneficiariam com uma moeda desvalorizada. Em quarto lugar, a verdade desconhecida é a dos prejuízos colaterais – para além do incumprimento da dívida – que uma eventual bancarrota da Grécia causaria aos outros países da zona euro. O diferencial em relação aos títulos do tesouro alemães [spread] não deixaria de crescer. Certamente, as consequências não teriam o mesmo peso para todos. Seriam mais pesadas para os países fracos, a começar por Portugal, em seguida a Espanha e a Itália, e mais leves para a Alemanha.

Europa não sabe como dar a volta à situação

Há muito quem diga que só uma união bancária europeia pode livrar a banca e os governos deste sufocante abraço. Uma união bancária com um fundo de salvação alimentado pelos próprios bancos, de modo a que os governos deixem de estar obrigados a compensar falências: isso permitiria resolver o dilema atual do "too big to fail" [demasiado grande para cair], que faz com que os grandes bancos façam o que lhes apetece, porque têm a certeza de serem salvos pelo governo quando a situação lhes correr mal. Se forem penalizados pelos seus atos, passam a avaliar os riscos de forma diferente. A Comissão Europeia preparou uma proposta. Mas a sua publicação já foi adiada dois anos porque os Estados-membros não a querem. Porque implica uma vigilância europeia forte. Isso equivale a uma transferência de soberania nacional, o que é, para muitos países, difícil ou tema tabu. A Europa não sabe como dar a volta à situação. Como os governos não querem um sistema europeu de forte regulação financeira, aumenta o risco de o contribuinte levar com uma série de faturas europeias, sob a forma de ações de recuperação financeira, no valor de muitos milhares de milhões de euros. E resta muito pouco dinheiro para estimular o tal crescimento económico de que François Hollande é atualmente o paladino. "A maior ameaça para a estabilidade financeira da Europa é o facto de os países da zona euro serem financiados por bancos que, se forem à falência, estarão dependentes dos governos aos quais emprestam dinheiro".

Ato patriótico permite grandes lucros

Taxas de juro mesmo muito vantajosas. No inverno passado, o Banco Central Europeu concedeu créditos muito baratos para mil milhões de euros, a fim de manter as trocas de empréstimos europeus. Os bancos da Europa do Sul aproveitaram estes créditos de muito boa vontade, a uma taxa de juro de 1%, para depois emprestarem aos governos cobrando-lhes 6% ou mais. Um ato patriótico que lhes permite ir tendo grandes lucros. Parece ser uma solução, mas cria uma dinâmica perversa: os bancos e os governos tornam-se de tal modo interdependentes que se enfraquecem mutuamente. "os bancos gregos estão absolutamente desgraçados". Parece ser um problema nacional. Mas isso é uma ilusão de ótica. O que vai acontecer se, de repente, os bancos do Sul não pagarem (não conseguirem pagar) os seus empréstimos ao BCE? "Por causa do euro, estamos todos no mesmo sistema". Indiretamente, o BCE somos nós. Todos nós, de todos os países do euro. Se as coisas correrem mal no Sul da Europa, outros países da zona euro terão de ajudar, para salvar a união monetária europeia. O BCE está, pois, sob forte pressão da Alemanha e da Holanda, no sentido de impedir esses empréstimos especulativos. O mercado financeiro interno é a base do euro. A fuga de capitais do Sul para o Norte destrói esse tecido. "A integração financeira da Europa está a recuar, pela primeira vez desde o início dos anos 1980". Os bancos retiram-se para as suas fronteiras: para serem mais fortes num país, deixam de conceder empréstimos a outro.


Não é possível tirar o crescimento da produção de uma cartola, como por magia,
e não há de facto dinheiro para investimentos.
Por isso há que manifestar uma certa estupefação com a forma como os políticos europeus,
encabeçados pelo novo Presidente francês, martelam uma simples palavra: crescimento.
Para o  grupo de reflexão de Bruxelas CPSE, a dicotomia "austeridade ou crescimento" é um "falso debate", que não faz avançar um passo na solução da crise do euro.
O verdadeiro debate, segundo ele, deve centrar-se nos bancos, especialmente os do Sul da Europa, que estão muito pior do que se pensava.
"Os bancos gregos e espanhóis estão sentados numa pilha crescente de dívidas”. “Só a Europa os pode salvar, os Governos grego e espanhol são demasiado fracos. É um problema europeu da maior importância."
No ano passado, depois de forte pressão política, os bancos europeus aceitaram cortes no pagamento da dívida do Estado grego, através de um perdão parcial. Depois disso, os mesmos bancos retiraram-se do Sul da zona euro, antes de novos cortes. Espanha, Itália e Portugal foram massivamente abandonados pelos investidores estrangeiros. Na Grécia, a fase seguinte já começou: até os gregos colocam o seu dinheiro no exterior. Estamos perante   uma imensa fuga de capitais. "Quatro, cinco, seis mil milhões de euros por mês. Ninguém os consegue travar."
Esta evolução acompanha a par e passo outra, igualmente prejudicial: devido à saída dos bancos do Norte da Europa, os do Sul vão-se afundando cada vez mais em dívidas. As obrigações de que os investidores estrangeiros se estão a livrar são compradas precisamente por bancos europeus do Sul. Fazem-no por pressão dos governos, mas também porque ganham dinheiro com isso. É que, em troca desse favor, os governos contratam novos empréstimos, a taxas de juros mais interessantes para os bancos.

terça-feira, 8 de maio de 2012

UE-CHINA

China cerca a Europa. Mas não percamos a esperança! A crise da dívida europeia é um alvo fácil para o investimento externo chinês. Por isso, precisamos de perceber que espécie de poder se está a tornar a China, escreve Timothy Garton Ash. Por vezes, a Europa colonizou pedaços da China. Agora, é a China que está a colonizar pedaços da Europa. Informalmente, é claro, e de uma forma muito mais bem-educada do que nós o fizemos. O crescimento da China tanto ilumina como explora o relativo declínio da Europa. Durante a sua visita à Europa, o primeiro-ministro Wen Jiabao vai visitar a Alemanha, o Reino Unido e a Hungria. Porquê a Hungria? Porque, por um lado, tem atualmente a presidência rotativa da UE mas, também, porque a China ali tem grandes investimentos e quer ter ainda mais – como acontece um pouco por todo o lado no sul e no sudeste da Europa. Um estudo recente do Conselho Europeu de Relações Externas (ECFR) estima que 40% do investimento chinês na UE está em Portugal, Espanha, Itália, Grécia e Europa de Leste. Porquê tanta atenção à periferia? Bom, porque há investimentos prometedores a serem feitos lá e porque estas pequenas e periféricas economias são a porta de entrada mais fácil para um mercado único europeu de 500 milhões de consumidores. O mercado da UE está muito mais aberto aos chineses do que o chinês está aberto aos europeus. Investir muito nestes países também traz recompensas políticas. Não é excesso de cinismo ver Pequim construir uma espécie de lobby da China dentro das estruturas de tomada de decisão, onde o Estado mais pequeno é, pelo menos teoricamente, exatamente igual ao maior. Com a maior reserva de divisas do mundo – cerca de três biliões de euros, atualmente – a China pode comprar metade dos bens públicos gregos a privatizar, de uma só vez. A Grécia deverá ter cuidado com estes presentes chineses? Bem, quem pede não escolhe. Acreditar no comércio livre Não devemos ser excessivamente paranoicos sobre este assunto. Se acreditamos no comércio livre e nos mercados, temos de praticar o que defendemos. No entanto, não há dúvida de que o poder económico chinês está a crescer na Europa – e a traduzir-se em influência política. Alguns dos vizinhos asiáticos da China sofreram muito mais com o crescimento da China. Enquanto alguns, na Europa, ainda sonham com um mundo pós-moderno de soberania partilhada, em que a UE seria um modelo de governo global, a geopolítica da Ásia está cada vez mais parecida com a da Europa do século XIX – em vez de se assemelhar à do fim do século XX. Para além das dimensões económica e militar do poder emergente da China, há ainda uma terceira dimensão: política, cultural ou de “suave” poder.

Campanha xenófoba para 2012

Depois da Espanha e da França, que introduziram novas restrições no mercado de trabalho por causa dos romenos, vários outros Estados anunciaram que vão alterar a legislação a fim de reduzirem a imigração. Com o pretexto de salvaguardar os empregos locais, o acesso dos imigrantes ao mercado de trabalho. Não se tratam exatamente de razões económicas, mas de entorses aos princípios democráticos da União, que foram ignorados. Sempre que a economia dos países de destino se contrai, aparecem atitudes de rejeição dos imigrantes. E, inevitavelmente, é o grupo mais importante de entre eles que é visado. Assim, os romenos são o alvo de várias campanhas nesse sentido. Apesar disso, apenas uma pequena minoria de romenos volta ao seu país. Apesar disso, apenas uma pequena minoria de romenos volta ao seu país, apenas 5% dos que partiram voltaram ao seu país, e por períodos curtos. Depois, voltam a partir para outros destinos.

Migração do género "bilhete só de ida"

A migração do género “bilhete só de ida”, como a dos italianos e dos irlandeses que embarcavam num navio com destino aos Estados Unidos e ali ficavam até morrer, desapareceu. Hoje, a migração é itinerante, de um país para o outro, em função do mercado de trabalho. Os migrantes distribuem-se tacitamente pelo mercado em função da aceitação e da penosidade do trabalho. Há, por isso, uma enorme diferença entre os emigrantes espanhóis e os romenos. Estes últimos são conhecidos como “apanhadores de morangos” porque, na sua maior parte, trabalham na agricultura dos países de destino e ocupam os empregos menos qualificados. Quanto aos espanhóis, estes vão para países onde encontram empregos especializados. A diferença entre romenos e espanhóis não é tanto a competência, mas a aceitação” de empregos diferentes. Na Irlanda, o número de habitantes que atualmente deixa o país é superior ao dos imigrantes que entraram no país na época em que era conhecido como “o tigre celta”. No último ano fiscal, abril2010-abril2011, mais de 40 mil irlandeses abandonaram a ilha, contra os 36 mil imigrantes que ali chegaram. A tendência migratória atual vai manter-se, por causa da crise e da recessão que atinge a Europa. Sobretudo porque os países que se juntaram à União em 2004 já ultrapassaram o período de transição (de sete anos, no máximo) que um Estado membro lhes pode impor para proteger o seu mercado de trabalho. A data limite para a Polónia, a República Checa, a Hungria, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, a Eslovénia e a Eslováquia foi 1 de maio deste ano.

Emigração

A crise leva os Europeus a retomar o caminho da emigração. É no norte do Continente que se encontra a salvação, tanto para os jovens dos países mediterrâneos, como para os da Europa oriental. No espaço de um século, os países europeus passaram do estatuto de países de emigração para países de imigração – transformaram-se em países de acolhimento. Como um íman, o desenvolvimento industrial tem atraído a população dos países pobres. Muitos migrantes voltaram depois aos seus países de origem, mas foi precisa uma injeção de mão de obra externa para cobrir o deficit de trabalhadores. Os últimos países de acolhimento foram os do Sul da Europa, destino preferido dos romenos, sobretudo. Neste momento, estes imigrantes concorrem, no mercado de trabalho, com os autóctones no desemprego. Perante esta situação, e às novas restrições em matéria de emprego de estrangeiros, imigrantes do Leste e autóctones do Sul tendem a procurar trabalho na Europa do Norte. No passado, a Europa já viveu grandes movimentos migratórios. Entre 1950 e 1970, cerca de 10 milhões de italianos, gregos, espanhóis e portugueses puseram-se a caminho de países europeus mais desenvolvidos. Depois de 1973, com o início do declínio demográfico no arco mediterrânico, os Estados que dele fazem parte abriram as suas portas aos trabalhadores estrangeiros. O ponto de inflexão – quando a imigração ultrapassou a emigração – foi atingido nos anos de 1980. Os fluxos vieram da África do Norte, depois, da Europa Central e Oriental. O processo acelerou-se depois da queda do Muro de Berlim. Agora, a Alemanha, o Reino Unido e os países nórdicos poderão ter de enfrentar um assalto sem precedentes porque, para além das populações com grande tradição migratória (Espanha, Itália, Irlanda e mesmo Grécia), há hoje uma enorme pressão dos países da Europa de Leste, com os romenos à cabeça. Quanto à Roménia, tornar-se-á, por sua vez, um país de imigração, mas tratar-se-ão, provavelmente, de trabalhadores vindos da Ásia, do Médio Oriente e da África. As últimas estatísticas britânicas mostram, por outro lado, uma dinâmica invulgar na relação com a Espanha. O número de espanhóis registados no sistema de segurança social britânico aumentou 85% durante o último ano fiscal (abril -2010-abril - 2011), por comparação com o ano anterior. Pela primeira vez, a Espanha faz parte dos cinco principais países de proveniência de imigrantes para o Reino Unido – depois do Paquistão, do Sri Lanka, da Lituânia e da Irlanda. Segundo a filial espanhola da agência de trabalho temporário Adecco, cerca de 110 mil pessoas deixaram a Espanha com um contrato de trabalho na mão entre 2008 e 2010, enquanto a taxa de desemprego naquele país ultrapassou os 21%. Mais de 4,2 milhões de pessoas estão sem emprego. Também entre os italianos se registou um aumento significativo: os 60 mil curriculuns vitae enviados para o Eurostat em março de 2010 passaram a quase 90 mil em setembro de 2011.

25 milhões de desempregados e o eldorado alemão

Em fevereiro, o desemprego na UE atingiu a taxa mais elevada dos últimos quinze anos. Segundo o Eurostat, 10,2% dos europeus estão sem emprego, ou seja, 24,55 milhões de pessoas. Na zona euro a taxa é de 10,8%, o que significa 17,13 milhões de pessoas. Com 5,7% (só a Holanda, a Áustria e o Luxemburgo têm menos desemprego) a Alemanha faz figura de eldorado, “Berlim faz publicidade junto dos europeus” para atrair mão-de-obra. Em algumas regiões e setores profissionais, a Alemanha está numa situação de pleno emprego e procura aumentar a mão-de-obra estrangeira que fala alemão. Um especialista em imigração afirma, no entanto, que as expectativas não devem ser muito elevadas: “A Alemanha não é a primeira escolha para os trabalhadores qualificados, tem que concorrer com outros Estados”. Refere-se sobretudo aos licenciados que falam inglês que procuram emprego sobretudo no Reino Unido. Por isso, Berlim não espera um grande assalto de desempregados gregos e espanhóis.

Mercado negro para resíduos biológicos

Terceiro: os que produzem energia através da cultura do milho podem dar-se ao luxo de pagar rendas muito mais altas pelos terrenos, chegando aos 1500 euros por hectare, o que gera uma concorrência desleal em relação aos que precisam de pastos para o gado. É o mesmo fenómeno que está a ser criado com os parques fotovoltaicos, pelo que se repetem os mesmos erros. Quarto: as próprias instalações, as de um megawatt, são estruturas de grandes dimensões, cuja construção sacrifica definitivamente terrenos agrícolas. Quinto: já se ouvem rumores sobre o surgimento de um mercado negro de detritos orgânicos, nomeadamente de sobras de matadouros, vendidos ilegalmente para produzir biogás. Nunca deveriam ser utilizados como biomassa, porque os resíduos da "digestão" são espalhados nos campos como fertilizantes, e esse tipo de desperdício não só polui como propaga doenças. É um problema de escala. Em si, o biogás a partir de biomassas é benéfico. Mas se for produzido para fins especulativos e sobredimensionado, se intensificar a produção de milho com o único propósito de alimentar as instalações de produção de energia, se fizer subir os preços dos solos, se os esgotar e poluir, então é preciso dizer basta. Alto e bom som. Estas questões devem ser colocadas sobre a mesa e discutidas durante os debates sobre a nova Política Agrícola Comum (PAC), que começaram há dias, em Bruxelas. Mais cedo ou mais tarde, os subsídios vão acabar. O biogás e as suas grandes instalações são um cautério na perna de pau da nossa agricultura doente e podem mesmo representar o seu golpe de misericórdia. A verdade é que vai ser muito difícil voltar atrás: os terrenos férteis não são recuperáveis, os lençóis freáticos estão contaminados, a salubridade desaparece, os que se esforçam por praticar uma agricultura correta são entravados por uma competição impiedosa e insustentável. Agricultura industrial, que paradoxo!

Produzir alimentos para produzir energia

O que está a acontecer? Muitos agricultores, em apuros por causa da crise generalizada no setor, tornam-se produtores de energia e deixam de produzir alimentos. Na verdade, cultivam apenas milho, de forma intensiva, para encherem os "biodigestores", geradores de biogás. Os investidores ajudam-nos e, por vezes, exploram-nos. Há quintas onde os agricultores são pagos por quem instala os equipamentos para cultivar apenas milho: tornam-se operários do setor energético, deixam de ser camponeses. Tudo começou em 2008, quando foi introduzido um novo certificado verde "agrícola" para produção de energia elétrica através de instalações geradoras de biogás a partir de biomassas. "Pequenas" centrais com potencial elétrico não superior a um megawatt. Mas um megawatt é muito e atiçou os empresários: é que foi atribuída uma tarifa de 28 cêntimos por quilowatt/hora aos produtores, ou seja, o triplo do preço que pagam pela energia "normal". E foi assim que o sistema de subsídios energéticos, somado ao da União Europeia para a produção de milho, tornou muito rentável a construção de grandes e dispendiosas instalações (podendo atingir os 4 milhões de euros), com custos que podem ser amortizados em poucos anos. Só na região de Cremona [norte de Itália], das cinco instalações licenciadas em 2007, passou-se hoje para 130. Calcula-se que o milho para produção de biogás ocupe atualmente 25% das terras cultivadas. Em 2013, deverá haver 500 instalações em toda a Lombardia. O meio ambiente e a própria agricultura estão ameaçados. Vejamos algumas constatações. Primeiro: deixa-se de produzir alimentos para produzir energia. Segundo: a monocultura intensiva do milho é prejudicial para o solo, implicando o recurso a grandes quantidades de fertilizantes químicos, e consome uma enorme quantidade de água, retirada de lençóis freáticos cada vez mais pobres e poluídos. Sem rotação de parcelas, a fertilidade fica comprometida e facilita-se a disseminação de parasitas – que são atacados através do uso de pesticidas.

O paradoxo da agricultura industial

Agricultura industrial: meditemos sobre este paradoxo. Em nome dele, o homem pensou poder produzir alimentos sem agricultores e acabou por expulsá-los do campo. Vigora hoje o conceito de campos cultivados sem produzir alimentos: uma agricultura não alimentar. Uma agricultura baseada exclusivamente no lucro e na especulação, que consegue transformar em desgraça tudo o que há de positivo: os alimentos, os terrenos férteis (que são cada vez menos) e até as energias limpas e renováveis. Como a fotovoltaica ou o biogás. Já me referi à forma como a energia fotovoltaica se pode transformar numa máquina de devorar solos e recursos alimentares. Agora é a vez das unidades de biogás, que exploram a biomassa, ou seja, os resíduos da criação de gado, as palhas e outros vegetais. São instalações ideais para resolver o problema do estrume, que é um martírio para os criadores, bem como de outros resíduos biológicos, aumentando os proventos através de uma energia que pode ser usada na agricultura ou vendida. Mas quando o conceito de negócio se intromete na questão, quando investidores que não querem saber minimamente se a agricultura produz alimentos (nem de que maneira) farejam um bom negócio e correm a tomar conta do biogás, aí a sua produção pode tornar-se uma maldição. É o que está a acontecer em muitas zonas do vale do Pó, especialmente onde há grandes concentrações de pecuária intensiva.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Financeiras islâmicas, um novo ator global

Sem os seus apoios agrícolas, a UE e a NAFTA não suportariam a concorrência dos produtos baratos africanos. O comércio externo do continente negro continua a ser mínimo, enquanto os conflitos, a falta de tecnologia e uma dívida monstruosa o remetem para um atraso de várias décadas. A esperança para África vem hoje da Índia e da China, que expatriam empresários em vez de comboios humanitários, e investiram cerca de 80 mil milhões de dólares nos últimos anos. Também o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) se está a tornar um ator de peso. Se os seus membros decidirem investir o dinheiro do petróleo em tecnologias e instituições financeiras, as suas economias deixarão de estar dependentes das matérias-primas e poderão dominar as economias estrangeiras. Quanto à iniciativa de um sistema bancário fundado na lei corânica, promovido pelo CCG, os seus benefícios (nomeadamente a estabilização do sistema financeiro, por meio da proibição da usura) estão ainda por demonstrar. Mas quem sabe se essas medidas não virão a constituir um valor completamente novo à escala mundial.

PIB da NAFTA comparável ao da UE

O sucesso inicial da UE incitou, contudo, as outras regiões do mundo a criar uniões. A maior parte terá poder real apenas dentro de algumas décadas; mas conseguem já impor-se em mercados até aqui reservados à Europa. De acordo com o Fundo Monetário Internacional, a participação da UE no PIB mundial passará, em 2014, de 30% para 25%. A NAFTA (ALENA) – Acordo de Comércio Livre da América do Norte –, união aduaneira entre os Estados Unidos, o México e o Canadá, dispõe já de um PIB comparável ao da UE, mas que progride mais rapidamente, mesmo em tempos de crise. A sua força reside, não somente numa política aduaneira harmonizada, mas também numa política voltada para investimentos recíprocos nos países-membros. Embora não seja uma criação perfeita (nomeadamente devido à política de imigração dos Estados Unidos, que exclui a livre circulação de pessoas), a NAFTA ambiciona tornar-se numa união económica das Américas. Chegou-se a falar de moeda comum – o "amero”. Até à data, a adesão dos países da América do Sul à NAFTA não foi possível, pela simples razão de que esses países criaram a sua própria – e poderosa – união. Desde 1969, Peru, Bolívia, Equador e Colômbia fundaram a Comunidade Andina, que, em 2008, participou, ao lado do Mercosul (com o Brasil e a Argentina a liderá-la), na criação da União das Nações Sul-Americanas (UNASUR). Esta pretende unificar toda a América Latina, à imagem da União Europeia. A UNASUR vai certamente levar tempo a tornar-se um concorrente sério, já que a América do Sul enfrenta regularmente crises económicas. À excepção do Brasil, que continua a ser um país poderoso, com uma política económica fiável.

Um contrapeso económico

Já em relação à união entre a Bielorrússia, a Rússia e o Cazaquistão, igualmente lançada no passado dia 1 de Janeiro, podemos interrogar-nos sobre qual o seu poder de atracção. Estes países, membros fundadores da Comunidade Económica Euro-Asiática (CEEA), formaram, para já, apenas uma união aduaneira. O objectivo anunciado de criar um "contrapeso” à UE deverá atrair os países da ex-União Soviética. Mas a ausência de uma lógica de acção para o longo prazo, o peso de sistemas fiscais desfavoráveis e uma imensidão de formalidades tornam infrutífera qualquer tentativa de estímulo às trocas mútuas dentro da CEEA. A ausência de concorrência real por parte da CEEA é uma fraca consolação para a União Europeia. A economia da UE parece um atleta que substituiu a sala de musculação por uma dieta no MacDonald's. Há vários anos que a sua balança de trocas comerciais é negativa: compra mais do que vende. O seu PIB gigantesco, de 19 triliões de dólares, contrasta com o declínio do seu crescimento (cerca de 0,5% em 2009, contra 3% em 2006). É o resultado de uma má gestão de prioridades: ainda não tinha terminado a integração económica e já se iniciava a integração política.

Uniões que não fazem a nossa força

Da Ásia às Américas, as associações regionais multiplicam-se, seguindo o modelo da UE. A má notícia é que corremos o risco de, a prazo, nos fazerem sombra na cena internacional. Quase quatro vezes mais habitantes que os 27 países da UE, uma superfície de 14 milhões de quilómetros quadrados e um Produto Interno Bruto de mais de 6 triliões de dólares: eis as características da nova zona de comércio livre formada a 1 de Janeiro pela China e os dez países da ASEAN (Associação das Nações do Sudeste Asiático), incluindo a Indonésia, Singapura e a Tailândia. Pequim manifesta assim a determinação de unir os vizinhos em seu redor, em vez de alimentar dissensões. Em 2013, o grupo China-ANSEA poderá alargar-se ao Japão, à Coreia do Sul, à Índia, à Austrália e mesmo à Formosa, que se mantém em conflito com a China. Nos 20 a 30 próximos anos, vai surgir na Ásia a mais poderosa união de todos os tempos, sendo a zona de comércio livre apenas uma etapa preliminar para a união aduaneira e monetária.
LIVRE CIRCULAÇÃO Desistir de Schengen é matar a ideia da Europa Cedendo ao pedido da França e da Itália, Bruxelas admitiu o princípio da reposição temporária dos controlos de fronteira dentro da UE. A decisão deve ser ratificada a 12 de maio. Uma regressão!!!! Imaginemos por um momento que os controlos nas fronteiras internas da União Europeia (UE) eram restaurados. Seria um desastre. Os cidadãos perderiam o tempo em alfândegas, os guardas de fronteira voltariam a ser esmagados pela carga de trabalho e voltariam às greves pela simplificação dos controlos (como fizeram os italianos e franceses no início da década de 1980, contribuindo assim para o estabelecimento do primeiro acordo de Schengen, assinado em 14 de junho de 1985 na cidade homónima, no Luxemburgo). Os orçamentos públicos seriam inflacionados pelos custos de pessoal e infraestruturas fronteiriças e os custos adicionais seriam pagos pelo cidadão, que sofreria mais impostos e compraria os produtos mais caros. Na verdade, isso remeteria para a situação que prevalecia antigamente. Mas haveria um outro preço enorme a pagar pela UE: abdicar de um princípio básico, a liberdade de movimento. O espaço Schengen deu a todos um sentimento de pertença a um território único. Quando nos deslocamos, de comboio ou de automóvel, de um país europeu para outro e apenas vemos um letreiro onde antes havia barreiras e polícia, é nesse momento que nos apercebemos da realidade criada pela UE. O “estrangeiro" fica mais próximo. Se reintroduzirmos controlos de fronteira, é provável que se assista a uma "tribalização" dos povos europeus: os vizinhos tornar-se-iam novamente "estrangeiros", mais estrangeiros do que há 20 anos. E para a União, seria o começo do fim.

ESPAÇO SCHENGEN

França e Alemanha querem poder controlar as fronteiras A França e a Alemanha querem travar a livre circulação na Europa. Uma carta assinada pelos dois ministros do Interior, que solicita "a possibilidade do restabelecimento do controlo das fronteiras internas". O documento poderá ser apresentado aos seus colegas europeus, na próxima reunião de 26 de abril. A suspensão do Tratado de Schengen justifica - se , uma vez que a segurança nas fronteiras externas da UE é insuficiente e que as questões de segurança interna se inserem no âmbito da soberania nacional. O restabelecimento dos controlos tem igualmente por objetivo impedir a migração económica, alerta para os riscos de uma política antieuropeia: De que vale uma abertura sob reserva? Que valor tem a liberdade de circulação, se os governos europeus tiverem permissão para a limitar? Se se retirarem para os respetivos territórios nacionais, os Estados estarão a indicar que estão convencidos de que o pequeno mundo do Estado nacional é muito melhor do que a Europa. Nessas circunstâncias, não é de espantar que os partidos nacionalistas, populistas e de extrema-direita melhorem os seus resultados em toda a Europa. O encerramento temporário das fronteiras internas representa uma publicidade constante para os inimigos da Europa. A classe política europeia encontra - se ainda nos anos 60 do século passado. Assim nada fará ressurgir a Europa.

SCHENGEN UE prepara-se para fechar mais a porta à imigração ilegal

“UE mobiliza-se contra a imigração ilegal”, que revela que a Dinamarca, que ocupa a presidência rotativa da UE, deverá propor, a 26 de abril, durante o Conselho de Ministros da Justiça e do Interior 90 medidas que têm como objetivo lutar contra um fenómeno que “aumentou 35% durante o ano passado”. Entre as medidas a propor estão uma melhor cooperação com os países de origem, por exemplo os países do Magrebe, o reforço do dispositivo Frontex e da vigilância da fronteira entre a Grécia e a Turquia, bem como uma melhor gestão dos fluxos migratórios, das expulsões e da luta contra o tráfico de seres humanos. Não se sabe exatamente quantos imigrantes ilegais há na Dinamarca – temos um receio justificado de que o grande número de imigrantes ilegais que estão atualmente na Grécia e em Itália comecem a dirigir-se para o Norte. Estas medidas justificam-se, também, por razões políticas: Os problemas da imigração ilegal prejudicam o mercado interno e o espírito europeu da livre circulação. Por isso, será uma vitória – também para a presidência dinamarquesa – se o projeto for bem-sucedido. Que erro!Espero sinceramente que exista uma nova visão sobre as questões das migrações populacionais por parte da classe política europeia.

Apetite pela vida

Se os portugueses se sentem em casa em Angola, adaptarem-se à vida no Brasil é ainda mais fácil. Segundo o Observatório da Imigração de Lisboa há, atualmente, cerca de 700 mil emigrantes portugueses a viverem e a trabalharem no Brasil. Em Espanha, que nos últimos dez anos recebeu cerca de cinco milhões de imigrantes da América do Sul, da África e da Ásia, a emigração espanhola para as antigas colónias da América do Sul é um assunto tão recente que há ainda poucos especialistas preparados para o discutir. Mas os números falam por si: segundo alguns consultores espanhóis na Argentina, há cerca de 1200 cidadãos espanhóis que se instalam naquele país todos os meses. “O emigrante típico é um homem entre os 25 e os 35 anos, quase sempre engenheiro, arquiteto ou especialista em tecnologias de informação”, diz uma especialista em mobilidade internacional. “Em resumo, homens jovens que querem novas experiências e desafios.” Nas antigas colónias a barreira da língua não existe e a adaptação cultural é fácil. Especialmente em Buenos Aires. Na viragem do século XIX para o século XX, cerca de dois milhões de espanhóis chegaram à Argentina na terceira classe dos barcos que faziam a ligação entre os dois países, vinham sobretudo da Galiza, a região mais pobre e agrícola do país, e é por isso que, ainda hoje, os espanhóis são conhecidos por gallegos [galegos] na Argentina. Na segunda metade do século XX, primeiro, por causa da ditadura e, depois, por causa da crise económica da década de 1990, foi a vez de os argentinos virem para a Europa. Agora, a tendência voltou a inverter-se. “Invasão europeia”, “novo Eldorado”, “expedição em busca de emoção” – são conceitos familiares e devem soar preocupantes aos ouvidos europeus. “Não, não há razões para se falar de uma nova colonização”. “Estamos, sim, a assistir ao nascimento de uma nova classe de migrantes que nunca se estabelecem permanentemente em lado nenhum. Mais cedo ou mais tarde, voltarão ao país de origem ou irão estabelecer-se noutro país qualquer onde as ofertas de trabalho sejam melhores.” Mas talvez esta inversão de tendência da migração seja um efeito de mudanças mais profundas que estão a ter lugar no mundo. O equilíbrio de poder entre o Ocidente e o resto do mundo ou, se se preferir, entre o Norte e o Sul, está a mudar.

EMIGRAÇÃO - Indignados estão a partir

Portugal já perdeu um em cada dez licenciados. O êxodo começou há alguns anos porque a crise e a grande taxa de desemprego atingiram o país muito antes de chegarem ao resto da Europa. Atualmente, Portugal tem 34% de jovens desempregados e a Espanha 50%. Se não fosse a emigração, estas taxas seriam ainda mais altas. Os que se tornaram obsoletos na Europa – engenheiros, arquitetos, operários da construção civil – são recebidos de braços abertos em África e na América do Sul. O Brasil está a preparar-se a todo o vapor para o Campeonato do Mundo de Futebol de 2014 e para os Jogos Olímpicos de 2016. Estão a ser contratados engenheiros e arquitetos em grande escala, até mesmo para o setor da energia onde há projetos que rondam os 200 mil milhões de dólares. No ano passado, a economia do Brasil cresceu quase 3%. A Argentina cresceu 8% e tem uma taxa de desemprego de 7%, três vezes mais baixa do que a da Espanha. Rica em petróleo, diamantes e outros recursos naturais, Angola é, hoje em dia, um dos países do mundo em mais rápido crescimento. Ali, o crescimento anual do PIB atinge os 15% e há três mil empresas portuguesas a operarem naquele país africano, construindo estradas, pontes, arranha-céus, linhas de caminho-de-ferro, condutas de petróleo. O país, assolado durante trinta anos por uma guerra civil que acabou apenas há uma década, tem falta de especialistas enquanto Portugal tem excesso de mão-de-obra qualificada. Há sobretudo dois grupos que estão a ir-se embora: pessoas mais velhas que querem poupar dinheiro e os jovens, que procuram desenvolver-se profissionalmente.
A imigração é uma bênção No mesmo dia, e estritamente pelas mesmas razões, o Presidente dos EUA, Barack Obama, num longo discurso proferido na cidade de El Paso, junto da fronteira mexicana, defendeu a legalização dos clandestinos presentes nos Estados Unidos, estimados em 11 milhões de pessoas. Não façamos confusão: nos EUA, a imigração é tão controversa como na Europa. Também lá, suscita uma hostilidade violenta. Também lá, constatamos a mesma hipocrisia: os clandestinos são bem-vindos para fazerem os trabalhos mais humildes em troca de salários magros. E a disponibilidade desse tipo de trabalhos é atrativa. Um outro ponto em comum é a migração de sul para norte. Atualmente nos EUA, um em cada seis americanos tem origem latino-americana; este ano, esta categoria ultrapassou o número da população negra e o espanhol é oficialmente a segunda língua do país. Na Europa, a pequena ilha de Lampedusa é, agora, o símbolo da atração exercida pela Europa próspera e democrática sobre as populações da África e da Ásia. Esta migração do sul para norte irá, provavelmente, continuar e, na opinião de Obama e Fischer, trata-se de uma bênção, desde que se mantenha controlada. Mas, existe uma diferença fundamental entre os Estados Unidos e a Europa. Obama pode incluir os seus argumentos em defesa da imigração num grande discurso sobre a história e a força do seu país. Quando se dirigiu à multidão presente em El Paso, disse: “Vejam a Intel, a Google, a Yahoo e o eBay, as grandes empresas americanas que nos colocam na vanguarda do setor das altas tecnologias. Adivinhem quem fundou cada uma destas empresas. Um imigrante”. No mês passado, em Washington, apanhei um táxi cujo motorista era originário da Etiópia. Confessou-me com algum sarcasmo: “O sonho americano é uma ilusão para a maioria das pessoas, mas é o que nos motiva”. A Europa não tem este tipo de histórias estimulantes. No continente agora sobressai uma história negativa aqui ou ali e os argumentos económicos e culturais em prol da imigração já não são o tema principal da atualidade e do debate político.

A diversidade é uma realidade na Europa

Melhor ainda, a chegada de novas culturas pode contribuir para a criatividade de que a Europa necessita, hoje mais do que nunca. Uma mensagem difícil de transmitir. Contraria completamente o discurso populista que transforma a migração em massa numa ameaça para o Ocidente. Joschka Fischer, antigo ministro alemão dos Negócios Estrangeiros e a sua equipa apelam insistentemente junto das potências líderes da Europa, não só na esfera política, mas também no mundo da cultura, dos órgãos de comunicação social e do ensino, para que se insurjam contra os falsos profetas. Consideram que os políticos das grandes correntes, ao submeterem-se ao populismo, tornando-se, desta forma, mais atraentes aos olhos dos cidadãos, não cumprem a sua missão de liderança. O presidente Nicolas Sarkosy, o primeiro-ministro David Cameron e a chanceler alemã Angela Merkel deveriam lembrar-se disso. Nos últimos tempos, estes dirigentes europeus declararam sucessivamente que a sociedade multicultural tinha falhado. Fischer e a sua equipa, que trabalham para o Conselho da Europa, evitam utilizar este termo que, na sua opinião, não se sabe verdadeiramente se representa uma ideologia ou uma realidade. Limitam-se a constatar que, na Europa, a diversidade é uma realidade, que foi uma realidade e que o continente não pode desviar-se desta realidade sem trair o Estado de direito democrático e se quiser continuar a ter um papel num mundo confrontado com a poderosa concorrência da China, do sudoeste asiático, da Índia e do Brasil.
Imigração, inevitável e indispensável Trabalhadores agrícolas norte-africanos sazonais no Sul de França. A imigração é benéfica para a Europa, assegura um grupo de pessoas eminentes, entre as quais Joshka Fischer, Javier Solana e Timothy Garton Ash. Uma mensagem que os dirigentes europeus deveriam escutar, escreve um jornalista holandês. Em pleno debate sobre a imigração na Europa, o grupo de eminentes personalidades sob a liderança de Joschka Fischer apresentou, a 11 de maio, um relatório (“Viver em conjunto”: Conjugar a diversidade e a liberdade na Europa do séc. XXI) cuja principal mensagem é a seguinte: Se não aprender a cultivar a sua diversidade, a Europa deixar-se-á atrasar inevitavelmente no plano demográfico. Por uma simples razão essencial: sem imigração, a população ativa diminuirá em cem milhões de pessoas nos próximos cinquenta anos, enquanto a população total aumenta e envelhece. A Europa deverá, portanto, abrir-se à imigração e à diversidade na sociedade. Na verdade, não podemos pedir aos imigrantes que renunciem à sua religião, cultura ou identidade quando chegam à fronteira. Na opinião deste grupo composto por oito personalidades, entre as quais o antigo secretário-geral da NATO, Javier Solana, a antiga comissária europeia, Emma Bonino e o académico e autor, Timothy Garton Ash, também nada há de mal no facto de os imigrantes trazerem a sua bagagem cultural, desde que respeitem a lei.
O celeiro ou o deserto da Europa? No Ocidente, o estudo agroquímico das terras é a condição “sine qua non” para todos os agricultores que compram fertilizantes para enriquecerem as suas terras. “Na Roménia acontece o mesmo mas, depois da Revolução de 1989, a fragmentação das terras [que se seguiu à coletivização própria dos regimes comunistas] gerou uma situação absurda”. “Um pequeno agricultor paga a análise quinze vezes mais cara do que um grande proprietário de terras”. Assim, “apenas 25% da superfície agrícola tem estudos agroquímicos, ou seja, trata-se dos terrenos comprados pelos grandes proprietários e pelos estrangeiros que já compraram um quarto da superfície cultivável". Consequência: a terra torna-se menos fértil, empobrece. “A este ritmo, a Roménia arrisca-se a tornar-se uma terra deserta e a perder a oportunidade de ser o celeiro da Europa”.
Voltar a ser o celeiro da Europa O mercado da agricultura biológica está em grande crescimento na Europa Ocidental e os europeus ocidentais estão constantemente em rutura de stocks. Importam da Suíça todos os equipamentos necessários para fazer produção biológica em larga escala. "O cereal que produzimos aqui vinha, até agora, do Canadá, Estados Unidos e da China”, explica um alemão especialista em marketing, que se juntou aos restantes famílias e trata da venda das colheitas. “Portanto, é normal tentar produzi-los na Europa. Há perspetivas extraordinárias na Roménia, convém lembrar que este país foi o celeiro da Europa entre as duas guerras mundiais. E prepara-se para voltar a ser."

Agricultura romena cresceu 11%


É impossível atravessar a Roménia sem nos cruzarmos com esses agricultores do Ocidente que retomam a atividade agrícola neste país. Com a sua experiência e investimentos, a agricultura romena cresceu 11%, em 2011, e estamos apenas no começo. Acabaram as terras de pousio e a sensação de abandono no campo.
Os romenos vendem as suas terras por uma média de 2000 euros por hectare, um preço imbatível na UE. Os subsídios europeus são de 180 euros por hectare, metade do montante que se pode obter na Europa Ocidental. Mas a partir de 2014, a nova Política Agrícola Comum (PAC) deve pôr toda a Europa ao mesmo nível.
Para comprar terras, na Roménia, um agricultor ocidental é obrigado a criar uma empresa no país; mas, a partir de 2014, qualquer residente na UE pode adquirir terrenos diretamente. É por isso que os agricultores se estão a despachar a comprar, antes que a especulação faça subir desmedidamente os preços.
Os mais ansiosos são os suíços, que já não conseguem pagar vários milhares de euros por hectare de terra helvética. Em Firiteaz, uma pequena aldeia no Oeste, os Hani, originários do cantão de Lucerna, mudaram-se com toda a família, há uma década: pai, mãe, dois filhos e dois netos. Compraram 800 hectares.
"Na Europa Ocidental, já não há espaço para os jovens". “Aqui, podemos construir algo a partir do zero. Acho que, para nós, jovens, é muito importante criar algo novo."